top of page

O Pint na Cozinha: Danny Littwin


Foto de e-Dublin

O violão é um instrumento que só apareceu na música irlandesa por volta da década de 60 e, desde então, vem ganhando espaço nas bandas e sessions irlandesas. Ainda assim, existem aqueles que não gostam de violão em irish sessions. Respeitável, já que o violão não faz parte daquilo que chamamos de trad. Ele é bem recente e, por isso, a harmonia é um elemento relativamente novo na música irlandesa. E para nos ajudar a entender melhor isso, nosso primeiro convidado é o Danny Littwin.

Ele toca violão desde criança por influência de seu pai, que também era músico. Tocou contrabaixo e guitarra com muitos artistas e bandas, já morou em muitos países do mundo e atualmente, está no Brasil com sua empresa de broadcast, a NY Digital.

Danny toca no grupo Oran, banda paulistana de música irlandesa, e junto com a Mila e o Gustavo, começou a tradicional irish session do Deep Bar 611 em São Paulo (SP) através da qual muitos de nós conhecemos e começamos a tocar música irlandesa.

Sua técnica no violão, além de ser bem tradicional da música irlandesa, tem bem marcada a sua personalidade através dos fraseados e das escolhas harmônicas e rítmicas que ele faz. Assim como cada violonista (ou cada harmonista) tem sua própria forma por conta de escolhas diferentes sobre os mesmos aspectos.


O Pint Diário - Danny, conta um pouco sobre a sua trajetória musical. Como você começou, onde estudou, com quem já tocou, quem são os músicos que mais te inspiraram e inspiram? E que estilos musicais mais te influenciam?

DANNY - Minha primeira memória da vida é assistindo meu pai aprendendo uma tune. Nós tínhamos um toca discos e ele ficava repetindo a música frase a frase com muitas repetições. Eu tinha 2 anos de idade. Comecei a tocar quando tinha 7. Tinham instrumentos pendurados na parede e eu peguei um deles e comecei a tocar. Afinação standard. Meu pai me mostrou como tocar os acordes de D e um A onde o dedo indicador não se move: 3º dedo na 4ª corda, casa 2 (E); 1º dedo na 3ªcorda, casa 2 (A); 3º dedo na 4ª corda, casa 2 (C#) .

Eu aprendi indo às sessions e assistindo outras pessoas. Eu não acho que sou um bom imitador porque sempre que eu tocava alguma coisa saia um pouco diferente (hahaha). Eu estudei música, clarinete, quando era criança e depois estudei teoria musical no ensino médio e na universidade. Eu desenvolvi um bom ouvido harmônico rapidamente e eu era muito bom em manter um ritmo sólido e improvisar. O Bluegrass ajudou, sempre foi um motivo de orgulho saber em que tom você está, mas às vezes você não conseguia ver, então você só podia confiar em sua audição.

Danny Littwin (canto esquerdo acima), Bob Morfi, Martin Daly e Susan Murphy.

Eu sou muito feliz por ter tocado com tantos bons músicos e ter trabalhado com ainda mais: Frankie Gavin, Alec Finn, Jackie Daly, Johnny MacDonagh todos do De Danann (Eu era seu técnico de som também), Mickey Dunne, Jerry O’Sullivan, Ivan Goff, Christy Barry - que me ensinou o que a música Irlandesa significa, Joe Burke, Kevin Griffin, Jason O’Rourke, Jack Coen, Mike Rafferty, Johnny Connally, Colm Murphy, Joanie Madden, Seamus Egan, Tony DeMarco, Brian Conway, Paddy Reynolds, Andy McGann, e muitos, muitos outros. Viver em Nova York era como assistir a uma aula de música tradicional irlandesa da universidade em nível de mestrado e nós tocávamos quase toda noite livre. Eu desenvolvi meu estilo tocando com incríveis pipers. Eu ouvia os drones e reguladores e tentava criar algo que se encaixasse. E também ouvindo os elementos rítmicos de um bom fiddler como referência. É muito importante ter a tune na sua cabeça e tocar alguma coisa que seja complementar, interessante e não muito confuso ou invasivo.


O Pint Diário - Explica pra gente que diferenças tem entre tocar violão na música irlandesa e no bluegrass?

DANNY - No Bluegrass, a ênfase rítmica frequentemente está no contratempo (No 4/4, seria o tempo 2). A música irlandesa costuma enfatizar o tempo 1, chamado downbeat. A maioria dos músicos de Bluegrass usam a afinação standart ou às vezes a Drop-D. E a maioria dos músicos de música irlandesa usam Drop-D ou DADGAD (minha preferência). Não existe uma regra. Minha forma de tocar realmente vem do Bluegrass - eu tocava com a banda do meu pai quando era criança, então essa foi a minha primeira influência. Então eu uso a técnica de fazer o baixo do acorde no primeiro beat e o resto do acorde no segundo beat. (Lester Flatt da dupla Flatt & Scruggs fez isso usando uma dedeira para a nota do baixo e uma unheira para o resto dos acordes. Ele foi realmente o primeiro a elucidar este estilo de apoio.


O Pint Diário - Atualmente, quais são seus trabalhos musicais?

DANNY - Atualmente eu estou produzindo música para um jogo, trabalhando em um álbum com Harmundi, trabalhando alguns novos arranjos para o Oran e também estou começando a próxima temporada de músicas para danças da Cia Celta Brasil. Também gostaria de começar uma banda de rock porque eu tenho trabalhado meu slide e está finalmente ficando respeitável.

Da esquerda para direita: Danny Littwin, Cesar Benzoni, Mila Maia e Carla Raiza
Oran no Festival Celta Brasil de 2017 - Foto de Leonardo Ramos

O Pint Diário - E agora AQUELA pergunta: na música irlandesa, a harmonia é livre e está sujeita às escolhas do próprio harmonista (ainda que esteja atrelada à rítmica e tonalidade da melodia). Percebo que cada pessoa faz escolhas bem diferentes e únicas, com base na sua própria musicalidade. Como você pensa a sua harmonia? Como você pensa para fazer o acompanhamento de irish tunes?

DANNY - A tune determina o acompanhamento. (Em inglês, harmonia é “backing” ou “accompaniment”) Escolha de acordes, escolha de vozes, o movimento contrário ou paralelo na linha de baixo e então criar um acompanhamento que seja coerente com o(s) músico(s) e com a música. As mudanças não são sempre óbvias, então você tem que estar alerta. Eu gosto de reforçar a melodia sem deixá-la sobrecarregada. Saber tocar uma tune específica torna o acompanhamento muito mais fácil.

Danny acompanhando as tunes na irish session.
Tradicional Irish Session no Deep Bar 611 em São Paulo - SP

O Pint Diário - Se você está em uma irish session em que alguém puxa uma tune que você nunca ouviu, como você constrói este acompanhamento? O que você pensa primeiro para acompanhar uma tune que nunca ouviu?

DANNY - Quando eu ouço a tune pela primeira vez eu gosto de ouvir todo o caminho (da melodia) para pegar qualquer esquisitice ou peculiaridades. Se eu tenho que tocar algo sem saber o que vem depois, eu faço aquilo que for mais simples, talvez mantendo apenas um pedal (baixo pedal) ou drone. Alguns compositores escrevem tunes muito complexas que exigem algumas vezes a mais para criar algo musical. Outras tunes são fáceis de pegar. Alguns ritmos não são óbvios, em outras vezes estão bem claros.


O Pint Diário - Danny, o que significa a harmonia ser um elemento recente na música irlandesa? E, que relação isso tem com o fato de a harmonia não ser fixa neste estilo?

DANNY - A música irlandesa é tocada normalmente em grupo, com todos tocando a melodia em uníssono. O acompanhamento da música irlandesa era, originalmente, o bodhran. A harpa tocava melodia e acordes. O fiddle podia usar cordas duplas de vez em quando, apesar de isso ter sido mais tarde. Quando a uillean pipes foi desenvolvida no meio do século XVIII, os drones e reguladores passaram a ser o acompanhamento. No século XIX e depois disso, apareceram os acordeões e as notas dos baixos eram usadas como preenchimento.


Toda música evolui. Gostos mudam. Tradição é complicado. Eu não posso tocar do mesmo jeito com um músico tradicional, e com um músico com tendências mais modernas.


O Pint Diário - Existe alguma diferença entre acompanhar uma tune e uma canção (além de uma ser instrumental e a outra, vocal)?

DANNY - É necessário deixar o vocal ser o centro absoluto das atenções. Qualquer coisa tocada precisa abrir espaço e dar suporte. Embora isso seja bom para acompanhar uma tune, é ainda mais importante para acompanhar um cantor.


O Pint Diário - Agora uma pergunta que se tornou polêmica aqui n’O Pint Diário: os reels são em 4/4, 2/2 ou 8/8? Como você pensa para tocá-los?

DANNY - 4/4 apesar de ser tocado em *“cut time”, depende.

O Pint Diário - Danny, que dicas você gostaria de dar para um músico que toca blues/rock/bluegrass e quer começar a tocar música irlandesa? E para um violonista iniciante que chegou hoje em sua primeira jam session?

DANNY - Ouvir The Bothy Band, Planxty e De Danann. Prestar atenção no acompanhamento que está sendo feito. Um músico acompanhante não será sempre bem vindo. Então na dúvida, pergunte. Sessions para iniciantes são boas para iniciantes, especialmente se lá estive um bom e paciente professor.

Distinguir o ritmo é a chave, músicos de Bluegrass provavelmente vão ter muita facilidade com isso exceto porque não há jigs no Bluegrass - apenas dedilhar alguns acordes cria um borrão e a música precisa de impulso e emoção.


*NOTA: 4/4 em “cut time” é uma maneira de se referir ao 2/2


Danny durante um show do grupo Oran em São Paulo - SP - Foto de Leonardo Ramos

57 visualizações0 comentário
bottom of page